É uma mulher de muitas facetas. Duvidam? Pode ser Maria, a observadora. É uma virtude compartilhada por várias mulheres. Acham as coisas na casa. Percebem o olhar ansioso de outra pessoa. Empáticas. Ela sabe que o vinho acabou. Ninguém mais tinha notado. Ela intercede junto ao filho. Jesus resiste: sua hora não tinha chegado. Maria insiste. Os noivos arão uma profunda vergonha. A água vira vinho em Caná pelo olhar solidário daquela mulher. Perceberam? O primeiro milagre foi anunciado por Gabriel. Outro fato incrível ocorreu em Belém junto a um lugar com animais. O primeiro milagre d’Ele foi em um casamento ao lado dela. Maria foi medianeira ativa em todos os atos humanos e divinos. Ela, sempre ela...

Pode ser Maria da Ajuda. Ela caminha para encontrar a prima, idosa e grávida. Não é fácil: Isabel carrega João Batista no ventre e Maria sente Jesus se formando. Uma grávida bem jovem ajudando outra gestante mais velha. Duas mulheres sem recursos e contando apenas com a solidariedade familiar. O encontro gera uma exaltação, o lindo Magnificat. O texto de Lucas emociona Bach, o luterano. A minha alma engrandece o Senhor... A serva humilde... a Bem-Aventurada. Todas as gerações! Tinha razão. Todas! Maria é a única mulher citada pelo nome no Corão.
Maria foi andarilha. A pé ou em lombo de burro por estradas poeirentas: lá vai ela de Nazaré para Belém. Depois, em pleno puerpério, tem de fugir para o Egito. Maria do desterro! Segue o caminho inverso dos hebreus do Êxodo. José e Maria não montam tabernáculo do Altíssimo no Sinai: eles levam Deus ao colo. A jovem de Nazaré embala uma nova aliança. Não é sacramento ou metáfora. Sem recursos, sem apoio, só com José e o recém-nascido, perambulam, ansiosos. Até onde chegará o ódio de Herodes? Exilada no Delta do Nilo. Língua estranha! Depois, seu marido sonha e eles vão para a Galileia. É peregrina em Jerusalém. Na agonia da cruz, recebe João como filho e, talvez, tenha chegado a Éfeso. O mundo é difícil para mulheres que viajam até hoje. Imaginem há dois mil anos em terra ocupada por estrangeiros arrogantes e violentos.
É também Maria da Angústia. Jesus, doze anos, se perdeu na multidão voltando de Jerusalém. Todas as mães de um filho desaparecido entenderão o desespero dela. Eram várias as espadas no coração que o velho Simeão tinha antecipado. O desespero chega ao ponto máximo aos pés da cruz. Alguém imagina a extensão do sofrimento de ver o filho sendo torturado em um madeiro ensanguentado? Lágrimas, impotência, a noite mais terrível da alma de uma mulher que gerou vida e a vê desaparecendo na tarde daquela sexta-feira. Enterrar um filho é o limite que conseguimos viver de devastação. Ter acompanhado sua agonia aumenta o desespero. É a Pietà! “Olhai, vós que ais, se há dor maior que a minha.” Não há.
Ouçam com a alma: é Maria do Silêncio. Ela fala um pouco, mas ouve muito mais. Guarda as coisas no coração. Testemunha falas extraordinárias. Escuta o Verbo. Ouve os discípulos d’Ele. Está em silêncio e oração na cena de Pentecostes. Chora – sem palavras registradas – no Gólgota. Jesus emite sete mensagens; ela, nenhuma. Aceita João como novo rebento. Acompanha a primeira canonização da história: “Ainda hoje estarás comigo no Paraíso”. Será que o bom ladrão a percebeu naquele lugar? Agradece com o olhar a oferta de José de Arimateia. Não possui túmulo. É a viúva de um carpinteiro pobre. O silêncio é uma expressão sutil do coração mariano.
Maria de Nazaré, do Patrocínio, dos Navegantes, do Perpétuo Socorro, da Luz, da Purificação, da Glória! Mãe irável! Maria Aparecida, do Parto, das Dores, do Bom Conselho, do Rocio, das Neves... Maria que fala em pilares, sobre azinheiras, em grutas, em penhas e em cerros. Maria relembrada em medalhas milagrosas, em escapulários, em ícones e estátuas. Rainha dos anjos, das virgens, dos mártires, adorada dos profetas, soberana dos patriarcas, dos confessores e dos doutores. Rainha, advogada nossa, consolo dos degredados filhos de Eva. Em um Filho a mãe gerou todos. O feminino em diálogo com a Trindade. Torre de marfim, flor da árvore de Jessé, pisadora da cabeça da serpente traiçoeira com o mesmo pé descalço que percorreu a Terra Santa. Lembrai-vos, ó piíssima Virgem Maria! Prometida no Gênesis, prenunciada em Isaías e vestida de sol no Apocalipse. Do início ao fim, sempre ela.
Azul é teu manto e branco é teu véu: mãezinha eu quero te ver lá no céu. Preservada da mácula original e assunta ao céu, eis a doce filha de Joaquim e de Ana. Sempre compadecida da sofrida humanidade que insiste em invocá-la mais do que imitá-la. Cheia de graça, luminosa estrela da manhã, plena do Espírito Santo, medianeira mãe de Deus. A mulher vestida de sol que enfrenta o mal sempre, com a Lua debaixo dos seus pés, e uma coroa de doze estrelas cintilantes. A rosa mística de perfume inigualável.
Pense bem, minha querida leitora e meu caro leitor. Se a figura de Maria (lembrada sempre no mês de maio) é capaz de comover um ateu empedernido, quanto mais vós, corações que se pretendem piedosos. Se Deus fez o burrinho de Balaão falar, peça a ele que permita compartilhar o amor do feminino teológico encarnado naquela jovem. Ó clemente, ó piedosa, ó doce sempre Virgem Maria. Maria, mãe da esperança, rogai por nós, ateus e cristãos, que recorremos a vós. Agora e na hora da nossa morte! Ave! Amém!