Marcos Molina, o bilionário da carne que conseguiu juntar o Marfrig e a BRF para criar uma gigante global da proteína animal, com receita de mais de R$ 150 bilhões, começou sua carreira à frente de uma empresa de miúdos de bovinos e suínos, em Mogi Guaçu, no interior de São Paulo. Dificilmente se poderia acreditar que, algumas décadas depois, alcançaria o tamanho atual. A Marfrig, que nasceu no ano 2000, é hoje a líder global na produção de hambúrgueres e uma das maiores empresas de carne bovina do mundo.
Na quinta-feira, 15, a companhia anunciou a incorporação da BRF — dona das marcas Sadia e Perdigão — uma operação que deve criar uma das maiores companhias globais do setor de alimentos, com forte atuação em proteínas animais. A Marfrig já era dona de 50,49% do capital total da BRF. A nova empresa se chamará MBRF Global Foods Company.

Molina (que foi procurado pela reportagem, mas não se pronunciou) era um açougueiro mirim de 12 anos quando começou a trabalhar no açougue da família — o principal da cidade nos anos 70 e 80. O comércio ficava perto da igreja Matriz e lá trabalhavam seus pais, Magali e Toninho Molina.
Seu negócio não era atender os clientes. Ele preferia fazer os cortes, limpar a carne e negociar com fornecedores, que, na época, eram matadouros locais. Já adolescente, gostava de ear pela cidade, nas horas vagas, com o Opala da família. “A família era simples, mas por serem comerciantes, donos de um negócio, eram mais ricos que a maioria das pessoas que morava na cidade naquela época”, conta um amigo de infância.
Não foi só dirigir cedo que Molina aprendeu. Em 1989, aos 16 anos, pediu para os pais o emanciparem para que ele pudesse ser dono da própria empresa, um frigorífico especializado em miúdos de bovinos e suínos, o Marfrio (“Mar” de Marcos, assim como o “Mar” de Marfrig). A aventura empreendedora do pequeno açougueiro rendeu nove anos de trabalho árduo.
A pequena empresa atuava só em Mogi Guaçu, com clientes locais. Depois, ele ou a fornecer para municípios próximos e para empresas e restaurantes de Campinas, a maior cidade da região.
Tudo virou cinzas quando, em 1998, seu frigorífico pegou fogo. Molina tinha 25 anos. “De acordo com o sargento Roberto Ketsuo, do Corpo de Bombeiros da cidade, o prédio foi destruído totalmente, mas não houve vítimas”, diz uma nota de um jornal da época. “‘Nós chegamos cinco minutos depois do alarme, mas o fogo já tinha tomado grande parte da estrutura do prédio’, disse o bombeiro”, na nota.
Dois anos depois, Molina voltaria a empreender e daria início à Marfrig, iniciando uma trajetória que nunca mais parou: comprar e vender outras empresas.
A primeira aquisição foi o frigorífico Bataguassu, em Mato Grosso do Sul. Em cinco anos, ele comprou mais três frigoríficos. Em 2006, foi a vez da maior empresa de carnes uruguaia, a Tacuarembó, ser abocanhada por ele, por US$ 35 milhões. Nos anos seguintes, foram mais de 40 aquisições.
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Molina sabe comprar bem e vender bem. É o que diz o engenheiro agrônomo Alcides Torres, da Scot Consultoria, especializada em agronegócio. “Ele é um sujeito extraordinário para os negócios”, diz Torres. Molina, segundo ele, sabe como ninguém aonde quer chegar.
“Ele gosta tanto do negócio que nenhuma de suas 80 empresas têm presidente. Quem manda é ele, que centraliza tudo”, afirma o consultor.
Mas Molina não fica só no ar-condicionado do escritório. O magnata da carne gosta mesmo é do cheiro do abate de gado. Tanto que quis ensinar isso logo ao seu filho Marcos, o Marquinhos Molina, hoje CEO da BRF Arábia . Levou o garoto com apenas quatro anos para ver como eram mortos os bois e porcos de sua empresa.
O garoto ficou impressionado com o sangue. Perguntou ao pai porque tinha de matar tantos bois. O pai disse que isso era preciso porque eles, os Molina, tinham “a missão de alimentar o mundo”, segundo relatou o próprio Marquinhos à revista Forbes, em 2023. Naquele tempo, o ex-açougueiro já queria ser global, a despeito de a Marfrig ser ainda apenas um frigorífico pequeno em Mato Grosso do Sul.

As pessoas próximas sabem que ele é sagaz. Mesmo dando a impressão que, durante uma conversa, Molina se disperse e pareça estar prestando atenção em outra coisa, o empresário anota tudo num bloquinho.
No começo da carreira, ainda falava como um garoto do interior, com frases cheias de “nóis vai”, “nóis quer”. Isso, porém, ficou no ado, embora a simplicidade continue sendo sua marca. Amigos e inimigos dizem que ele é uma pessoa agradável, do tipo que gosta de conversar tomando café na cozinha.
Com a fusão entre Marfrig e BRF, Molina parece estar levando muito a sério seu plano de alimentar o mundo.