Filha de Fumie Minata Wakuda e Euro Takeshi Wakuda, Vivianne Wakuda veio de uma família de feirantes e agricultores de origem japonesa. A mãe da Giulia Hikari se dedica à confeitaria Yogashi há 20 anos e, de Ibiúna, interior de São Paulo, para o mundo, sua filha conquistou o lugar de rainha das choux cream e de outros doces japoneses inspirados em técnicas sas com sua própria patisserie.
O início de tudo
Desde pequena, Vivi, para os íntimos, ajudava no sítio da família, plantava, colhia e vendia produtos na feira. “Eu via a vida deles muito sofrida. Eu estudava durante a semana e trabalhava sábado e domingo na feira, então não existia folga, claro, nem para mim e nem para eles”. Com uma família batalhadora e um contato constante com a comida desde sempre, a determinada adolescente ou a enxergar uma profissão naquilo tudo.
“Eu era péssima na escola, por exemplo, porque eu não tinha tempo para estudar, eu saía da escola e ia trabalhar. Acordava de madrugada para ir na feira. Aí, pensei, gente, a única coisa que eu sei fazer além da feira é cozinhar”. Então, com muito custo, seus pais a ajudaram com o nada barato curso de gastronomia.
Por dois anos, Wakuda se dividia entre São Paulo e Ibiúna. “Sexta à tarde, eu já ia para Ibiúna, ajudava a higienizar verdura, carregar o caminhão e trabalhava sábado e domingo. Segunda de madrugada, eu voltava para a capital para fazer o curso”.
Durante seus estudos, a jovem descobriu que, na verdade, sua paixão não estava na cozinha, mas na confeitaria. “Foi engraçado, porque os módulos de confeitaria, não são tão completos dentro do curso de gastronomia. É tudo mais voltado para a cozinha quente, preparos salgados, mas eu falei: ‘nossa, acho que eu tenho uma mão para isso’. O desafio de ter que estar tudo certo em detalhes, as pesagens, as técnicas e preparação me envolveu de certa forma”.
A aspirante a chef confeiteira
Ela acha até engraçado ter seguido esse caminho, “em famílias de descendentes japoneses não tem tanto doce, era doce de feijão, de mochi, de agar-agar. Tinha uma tia-avó minha que fazia um negócio só com açúcar e corante. Era tão duro que você batia, jogava na parede e ele voltava. Toda vez que eu ia na casa dela tinha certeza que ia ter esse doce. Então, eu não achava doce gostoso, né? Mas aí, eu vi que tem muito mais variedade”.

Ela gosta muito da choux cream, típica da culinária Yogashi, e, inclusive, ficou conhecida por seu doce de extrema qualidade. No entanto, para a surpresa de alguns, a torta de maçã do McDonald’s com sorvete de baunilha é sua sobremesa preferida da vida. “Confeiteiro às vezes têm gostos duvidosos”, brinca, “mas essa tortinha é o doce que sempre tenho vontade de comer”. Apesar disso, um belo bolo de brigadeiro também tem lugar em seu coração, bem como um croissant de amêndoas bem-feito.
O caminho profissional
Além do desejo de estudar mais sobre confeitaria, Vivi queria, ainda por cima, estudar fora. Apesar do alto custo, aos vinte anos, buscou bolsas de estudos que eram oferecidas pelo governo japonês para pessoas com certo grau de proficiência na língua e conquistou a oportunidade de estagiar dentro de uma confeitaria Yogashi naquele país. Ela se encantou por essa mescla de culinárias, que pega técnicas de fora e, ao mesmo tempo, utiliza ingredientes japoneses, voltado para o paladar asiático.
Em 2009, de volta ao Brasil, Wakuda se mudou para a capital paulista e começou a trabalhar na Pâtisserie Douce , muito focada nas técnicas sas clássicas. “Foi meu primeiro emprego, eu entrei lá como estagiária e saí como chefe de partida na época. Fiquei três anos.”
No Japão, ela conquistou um amadurecimento pessoal, aprendeu “a se virar e a entender hierarquias”. Na Douce , cresceu ainda mais profissionalmente, dominando a base da técnica clássica sa. À época, ter uma loja própria nem ava por sua cabeça, mas principalmente por insistência da mãe, isso começou a se tornar um objetivo.
“Quem me incentivava, falava que eu tinha que ter uma coisa minha, era minha mãe, meus pais, né? Por isso que eles se esforçavam tanto, eles sempre deram esse apoio, e a gente [Vivianne e os irmãos] reconhece esse sacrifício. Meus pais deram oportunidade para todos os filhos fazerem o que quisessem da vida, oportunidade essa que eles próprios não tiveram, não fizeram faculdade. Então, como gratidão, eu fui atrás disso.”
Nesse meio tempo, Vivi estava dividida entre crescer na confeitaria, ando por outras casas, como o Aizomê, de Telma Shiraishi, sempre com o desejo de proporcionar mais um motivo de orgulho a seus pais. Então, em 2017, ela criou coragem e investiu em seu próprio negócio.
Vivianne Wakuda Pâtisserie, a loja

A partir daí, mais um recomeço. Numa casinha da Liberdade, dentro de uma vila portuguesa, a Vivianne Wakuda Pâtisserie foi inaugurada. “Eu fui fazendo as coisinhas sob encomenda, a gente começou a ter laços profissionais, a ter contatos com outras pessoas que têm restaurante. Na época, eu já estava há 8 anos por aqui, então as coisas foram dando certo, fiz casamentos, dei aulas, mas então chegou a pandemia”.
O ano de 2020 foi bem complicado para Vivi, mas foi em função dessas adversidades que a loja ou a ter um sistema de vendas online eficaz. As encomendas foram crescendo, a clientela aumentando e, a necessidade de um lugar maior surgiu. Daí, a patisserie ganhou asas e aterrissou numa outra casinha em Moema.
Pouco tempo depois, a casinha com um salão improvisado no quintal e uma lona como cobertura também ficou pequena, e o atual endereço em Pinheiros foi o novo destino de Vivi e seus doces. Ao final da pandemia, “a gente percebeu que as pessoas queriam sair de casa, voltar a frequentar lugares depois do tempo de isolamento”. Por isso, fomos para a terceira casa. Agora, a pâtisserie está bem acomodada, tem salão climatizado, uma cozinha de produção de respeito e ainda um quintalzinho asfaltado para os pais de pet. Tudo isso, sem jamais perder a essência.
“Eu quis manter a estrutura da casa, o arco na frente, o teto foi preservado e o interior com marcenaria japonesa, para mostrar de onde são nossas origens, uma oportunidade de mostrar também quem é a Vivianne.”
Vivi Wakuda, filha, mãe e confeiteira de mão cheia

Certamente a jornada de Vivi teve inúmeros desafios, inclusive pessoais. Antes da inauguração da sua primeira loja na Liberdade, sua mãe faleceu de câncer no pâncreas e deixou um vazio na família. O acontecido a fez voltar a suas origens, ajudando o pai na feira. Na época ela se reencontrou com a rotina de quando tinha 18 anos: de segunda a sexta, confeiteira em São Paulo, sábado e domingo, feirante em Ibiúna.
“Foi tudo muito rápido, e a morte dela mexeu com todo mundo. Então meus irmãos e eu sabíamos que nosso pai precisava desse apoio. Foi um período difícil, a gente trabalhava muito, mas parece que a partida dela reuniu a gente.”
Em meio às três mudanças de endereço, Vivi se tornou mãe da pequena Giulia, hoje com dois anos, e continuou investindo em sua confeitaria em Pinheiros, mantendo um clima aconchegante e familiar, que faz cada cliente se sentir em casa.
O ambiente ganha um toque pessoal da chef nas obras de arte espalhadas pelas paredes, nos painéis e murais pintados por dentro e por fora da loja e nas estantes, sobretudo na que fica bem ao lado da entrada da confeitaria, com bibelôs japoneses e uma foto da chef ainda pequenininha e sua mãe sentadas à mesa. “Eu coloquei essa foto do meu aniversário, que ela não deixava ar em branco, como uma lembrancinha, como se ela estivesse sempre olhando a loja”.
E assim, todos que visitam a loja podem ver Fumie Minata Wakuda, a fonte de motivação que falava lá atrás para a filha: “você trabalha muito e um dia tem que ter o seu negócio, né? É mais do que justo”, a mãe que mostrava com orgulho para todo mundo na feira a filha estampada numa matéria impressa de jornal. Antes de tudo, ela acreditou em Vivi e, agora, observa, orgulhosa, todas as conquistas da sua pequena grande chef confeiteira.

Vivianne Wakuda Pâtisserie
Rua Joaquim Antunes, 1093
De quarta a sábado, das 10h às 18h. Domingo, das 10h às 16h. | Fechado no último domingo do mês.