Ao entrar no mercado de trabalho, o paranaense Michel Rodrigues, de 34 anos, escolheu a área de tecnologia da informação. Mas, depois de ar a virada do ano novo de 2013 para 2014 no emprego, devido a um problema no servidor do hospital onde trabalhava, decidiu mudar de área.
Na época, Michel foi convidado pelo pai, Vilmar Rodrigues, de 56, para trabalhar com a técnica de martelinho de ouro na Vilmartelinho, oficina da família em Cascavel (PR). O choque entre a experiência do pai e a tentativa de inovação do filho se tornou um desafio para os empreendedores.
Aos poucos, contudo, a dupla se adaptou à nova dinâmica do negócio e, hoje, tem clientes até na Austrália e fatura R$ 50 mil por mês.
Trabalhar com TI foi de sonho a problema
Nascido e criado em Cascavel, no interior do Paraná, o primeiro emprego de Michel foi como ajudante na pizzaria de um tio, ainda na adolescência. Por influência da mãe, na mesma época, ele fez um curso básico de informática e gostou da área de tecnologia.
Já na faculdade, decidiu estudar Sistema de Informação e se especializou em hardware (parte física de um dispositivo eletrônico) e software (conjunto de programas que permitem que o hardware funcione). Em 2012, Michel começou a trabalhar no Hospital do Câncer de Cascavel.

“Um hospital não para nunca, eu tinha que estar disponível dia e noite, caso acontecesse algum problema no servidor”, afirma. “Eu me dedicava tanto ao emprego que não tinha vida”.
A virada de chave na vida de Michel aconteceu na noite de ano novo de 2013 para 2014. Ele foi acionado para resolver um problema no hardware do hospital minutos antes da virada e perdeu todas as comemorações.
O paranaense conta que só voltou para casa na manhã do dia 1º de janeiro e encontrou o pai. “Ele disse que eu me doava muito para algo que não tinha tanto retorno. Não concordei no começo, mas depois vi que ele tinha razão”, afirma.
Trabalho com o pai teve início conturbado
Para ajudar o filho a mudar de profissão, Vilmar convidou Michel para trabalhar com martelinho de ouro - técnica artesanal usada para desamassar carros - na Vilmartelinho, fundada em 2009.
“Eu fiquei com receio, porque sabia que era algo que não adiantava fazer um curso, precisava de experiência”, conta. Ele decidiu pedir demissão do hospital e aproveitar os seis meses em que receberia seguro-desemprego para se arriscar na nova profissão.
Michel afirma que, no início, achou que aprender a parte técnica seria o mais difícil, mas entendeu na prática que o maior desafio era ter um negócio com o pai. O principal motivo das brigas era a pressão de Vilmar em relação ao desempenho do filho.

“Eu entendo que a cobrança foi essencial para o meu desenvolvimento, mas era complicado. Nós tínhamos problemas no trabalho e, quando chegávamos em casa, a discussão continuava. Não tinha descanso ou folga”, diz.
Outro ponto que gerava conflitos entre a dupla era a inovação no negócio. Michel conta que gosta de procurar por novas técnicas e ferramentas disponíveis no mercado, mas o pai era resistente a qualquer mudança.
Aos poucos, os dois encontraram um jeito de istrar a Vilmartelinho em equipe. “Ele entendeu que a mão de obra era a mesma, mas os equipamentos não precisavam ser. Conseguimos juntar a experiência com a inovação”, comenta.
Eventos climáticos extremos aumentaram serviço
Michel começou a trabalhar com carros atingidos por eventos climáticos extremos em 2016, ao ser contratado para restaurar veículos danificados por uma tempestade de granizo em Rio Claro (SP). Três anos depois, ele participou de uma operação em Sydney, na Austrália, para recuperar 3.000 automóveis afetados pelo mesmo fenômeno.
Os valores cobrados de cada serviço variam de acordo com os danos e o modelo do carro, segundo Michel. O conserto de estragos provocados por chuvas de granizo, por exemplo, pode custar de R$ 2 mil, se a pedra for leve, a R$ 10 mil, se o granizo for pesado.
Ele afirma que o número de clientes que procuram a Vilmartelinho devido a problemas causados pelas chuvas cresceu nos últimos dez anos. “Percebemos que os danos também são mais graves, o granizo parece cada vez mais pesado. Antes, era comum a chuva só amassar as laterais, mas hoje destrói tudo”, aponta.
O martelinho de ouro é mais barato e mais rápido do que os serviços de funilaria tradicional, mas há limites do que é possível consertar com a técnica artesanal.
Um diferencial utilizado por Michel para atrair mais clientes é a preservação da originalidade do carro. O argumento costuma convencer especialmente os colecionadores de veículos antigos, que têm apego emocional com o automóvel e representam 20% dos clientes da oficina, segundo o paranaense.
Leia também em PME
Pai e filho planejam expandir negócio
Michel afirma que recebeu convites para trabalhar em outros países, depois de ar uma temporada na Austrália, mas rejeitou por ter dificuldade de se comunicar em outros idiomas. Ele foi para os Estados Unidos neste ano para estudar inglês e aprimorar a técnica de martelinho de ouro.
A gestão do negócio ainda é responsabilidade do paranaense, que cuida de todas as áreas à distância, do marketing ao agendamento dos serviços. A parte prática do trabalho, por enquanto, está nas mãos de Vilmar.
Os dois querem expandir o negócio: a princípio, a ideia é ter mais unidades no Brasil, mas eles analisam a possibilidade de ter um ponto de atendimento na Austrália.
“Hoje, eu vou a feiras e estudo para aprimorar a técnica. O meu intuito é voltar ao Brasil, contratar pessoas para nos ajudar a dar um o a mais e aumentar a empresa”, conclui.

Avaliação de clientes
A Vilmartelinho recebeu uma classificação média de 4,9 de 5 estrelas no Google, com 15 avaliações até a publicação desta matéria. Os comentários positivos elogiam a qualidade do serviço. Não há avaliações negativas.
Os autores das notas concedidas não podem ser verificados. Eventualmente, avaliações positivas ou negativas podem ser uma ação a favor ou contra a empresa.
A oficina não tem um perfil no site Reclame Aqui.
Setor automotivo é promissor, diz especialista
O Brasil atingiu no ano ado a marca de 123 milhões de veículos registrados, o que indica um aumento de 4% em comparação com 2023. Os dados são de uma pesquisa realizada pela Veloe em parceria com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) e a Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran).
O consultor de negócios do Sebrae-SP Reginaldo Oliveira aponta que o crescimento do número de veículos em circulação torna o setor automotivo promissor para quem quer empreender.
Ele explica que as oportunidades aparecem tanto para negócios de reparos, já que os contratempos no trânsito são mais frequentes, quanto para empresas voltadas à manutenção e à limpeza, porque as demandas são recorrentes. “Serviços como martelinho de ouro possuem um alto valor percebido, uma vez que o cliente está disposto a pagar mais por qualidade e capricho”, avalia Oliveira.
Por outro lado, encontrar mão de obra capacitada é um desafio, especialmente nas áreas de reparos e comércio de peças. “Investir na formação e na valorização de profissionais pode ser estratégico”, aponta o especialista.
O local escolhido para montar o negócio também faz toda diferença. Oliveira diz que é importante estar próximo a vias movimentadas e bairros populosos, para favorecer o fluxo de clientes.
É preciso ainda ter atenção à regulamentação, já que oficinas e comércios automotivos exigem licenças da prefeitura, do Corpo de Bombeiros e de órgãos ambientais. No caso dos lava-rápidos, o especialista destaca a necessidade de autorizações especiais para uso de água e descarte de resíduos.
“O empreendedor tem que definir os processos internos e estabelecer metas para contribuir com a eficiência. Afinal, o veículo não deve permanecer parado no estabelecimento por mais tempo que o necessário”, conclui o consultor de negócios.