O festival de baixaria que acomete a política brasileira apresentou mais um espetáculo grotesco na agressão sofrida pela ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, nesta terça-feira, na comissão de Infraestrutura do Senado. A exibição de incivilidade foi possível porque a ministra encontra-se desprestigiada dentro do governo, que pouco faz para proteger suas causas, como na aprovação no Senado de licenças mais ágeis para grandes projetos, caso da exploração de petróleo na costa do Amapá. Mas a ação de emparedar a ministra tem um motivo a mais, eleitoral. Hoje, em grandes extensões do Brasil, combater a agenda verde dá bastante voto.
O Brasil anda tão dividido em tantas questões-chave para o nosso futuro e não é diferente no tema ambiental. Ao mesmo tempo, em que nos preparamos para receber a 30.ª Conferência da ONU sobre Mudanças Climáticas (COP-30), em Belém, há toda uma leitura e mesmo disseminação de visões que colocam a política de sustentabilidade como responsável pelo atraso do desenvolvimento de amplas regiões.

Tome-se o caso do Estado de Roraima. Foi lá que o ex-presidente Jair Bolsonaro obteve mais votos percentuais em 2022 (não foi em Santa Catarina!). Parte massiva da população, inclusive os caboclos, mais pobres, tem a convicção de que as reservas indígenas isolam o Estado e não permitem que a região prospere. A excessiva proteção aos indígenas, segundo essa visão, impede até mesmo a chegada ao Estado do linhão de Tucuruí, com energia elétrica. A capital Boa Vista é hoje abastecida por usina a diesel – cara e poluente.
Raciocínio semelhante ocorre com a BR-319, que liga Porto Velho a Manaus, e atravessa o Estado em cerca de 600 km de terra à espera de asfaltamento. O presidente Lula, aliás, já se posicionou a favor da conclusão da obra, assim como da exploração do petróleo na costa norte. O que ambientalistas veem como permissão à destruição, políticos de muitos Estados convencem a população de que é um impedimento ao crescimento econômico e uma condenação ao isolamento. Questões como essas não se limitam à região Norte e se espalham por todo o Brasil.
Soma-se a isso a teoria (conspiratória?) de que as ONGs que atuam pelo País, na verdade servem aos interesses de produtores americanos e europeus, que querem barrar a dominação econômica do agronegócio brasileiro. Toda essa visão ambiental seria apenas um disfarce para uma guerra econômica global. São porta-vozes desse ponto de vista tanto o ex-ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, ou mesmo a produtora Brasil Paralelo, blockbusters da direita em doutrinação político-cultural. Soma-se a isso um certo “nacionalismo” regional no sentido de que gente de São Paulo, de Brasília, tende a interferir no destino de quem está distante sem conhecer de fato suas agruras.
Não é à toa que os três senadores à frente do achaque a Marina são do Norte: Plínio Valério (PSDB-AM), Marcos Rogério (PL-RO) e Omar Aziz (PSD-AM). Tudo isso sob a anuência, em tese, do presidente do Congresso, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), que quer muito ver seu Estado beneficiado pelo dinheiro do petróleo a despeito dos riscos ambientais. Mas não estão sozinhos.
Com uma trajetória notável, a ministra Marina Silva é uma referência mundial. Recebida com tapete velho em fóruns internacionais. Mas hoje, cada vez mais, tem dificuldade de colocar os pés na região que defende. Não consegue mais sustentar sua causa de maneira eficiente, em boa parte devido à articulação eficiente de seus adversários, pessoas e de sua causa. Não se intimidaram nem mesmo com o risco de serem chamados de machistas, misóginos, e foram para cima. Sabem que serão recebidos de braços abertos em suas bases eleitorais.